domingo, 11 de novembro de 2012

O segredo do Anel



Sete anos.
Uma vida inteira em fragmentos pelo universo afora. Enigmas escritos em estrelas que versam em música, as metáforas não pronunciáveis em palavras. A música de um choro, o gemido da criança expelida entre lágrimas de amor.
Tudo faz sentido, ela segura o anel e suspira, enfim, a verdade.
As cores dançam nas ruas, nas vitrines, as árvores dizem tanto no balouçar de suas folhas, e quando o outono lhes despem nas frias noites, dizem tristes histórias uivando ao vento com seus galhinhos esturricados o sentido da primavera, pelo contraste da intensidade de um inverno. Todas as coisas dizem seus mistérios.
Tanta dor.
A pedra cintila azul. Topázio azul, um azul de profundidade infinita, de lágrimas, de tristezas passadas e por vir. Uma coisa. O anel é apenas uma coisa, o veículo da mensagem que veio desse entender de hoje, dessa sensação de adivinhar o que há por vir estampados na dura permanência em forma de uma pedra. Pedra que já esteve enclausurada no subsolo, em repouso, em silencio profundo, parte da sustentação deste solo que sustém o peso das gerações que passam. Os grãos da tua poeira falam.
Um dia tesouro do garimpeiro, noutro do comerciante, na mão da graduanda feliz, da esposa, da mãe.
A pedra nasceu bruta, foi gerada pelo tempo, pelas condições propícias do solo, suja, foi manejada pelos homens mais rústicos de mãos calejadas. A pedra sofreu perdas imensas, partes de si amputadas para sempre para lhe darem o formato retangular. Enfrentou as lixas cruéis, o calor das fricções em polimento.
O designer um dia se assentou, de lupa na mão examinava-a entre a pinça pungente. O designer avaliou-a do ápice à base, esquadrinhou sua beleza e inspirou-se nos arabescos para acentuar-lhe a glória azul; decidiu que a pedra descansaria em uma liteira de ouro.
E foi assim, manhã de 31 de outubro de 2003, dia de halloween que ela passou pela vitrine da loja e entendeu que a pedra lhe dizia um enigma e embora não pudesse entender naquele dia, não pode resistir-lhe como que hipnotizada. Uma vez tocada, se tornou escrava do anel, embora não pudesse levá-lo pois nunca poderia comprar joia tão cara.
No ano seguinte ela partiu para bem longe, iria estudar por um ano. Era uma estação de milagres tantos. Conheceu o amor de sua vida, um amor barroco. Casou-se. Havia deixado aqueles três anos sonhados da faculdade para trás. Sofria. O que fizera? E agora? Nada faz sentido na confusão da mudança. Traçara caminhos na areia, e o vento do tempo os apagara.
Em 2007 retornou, não podia viver o transtorno de abandonar um sonho tão imenso que havia sido aquela faculdade. Deixou o esposo, o cão faleceu, o dono da loja pediu para o esposo entregar as chaves em 120 dias, depois de 16 anos no mesmo local. Caos. Lágrimas de saudade. Noites em claro mergulhada nos livros, sorvendo o café do pai. Viera dizer adeus. Andando nas ruas tão estranhas quanto familiares, avistou o anel de longe. Já nem lembrava dele. Ele ainda esperava por ela.
Decidiu que seria seu anel de formatura. Faltavam os símbolos, o ourives cravejou à direita uma flor-de-lis e à esquerda a coruja. Comprou a prestação, agora podia pagar as prestações. A pedra tinha um risco, razão porque permanecera esperando, uma marca sulcada na superfície. O ourives ofereceu desconto ou lapidar novamente. Optou por lapidar. A pedra guarda essas marcas dos últimos toques.
O anel fica em uma gaveta, na maior parte do tempo, sempre grita de lá quando a gaveta é aberta. A estória toda lhe passando por um instante pela mente. Oras ela sorri, outras chora. Uma pedra cor da água da saudade.
Dentre as peças tantas do quebra-cabeça enigmático, outro dia ensimesmando começou a ler coisas antigas. Relembrou aquele texto, o dia do halloween, os cheiros todos, os risos da amigas que não lhe sorriem mais. Ao final daquele relato, a data: madrugada de 01 de novembro de 2003.
Exatamente sete anos depois, às 2:57h puxara os bracinhos da filha que nascia para o mundo para si. Abraçara o prólogo de uma nova história. O anel tentara lhe dizer, ela sabia em sentimentos e só agora fora concedido o conhecimento daquele mistério. A pedra do anel, a pedra do mês da criança, a porta de um segredo ainda por vir.



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