Outono do sonho
Secas
as folhas crepitam
lançadas ao vento
fadadas ao pó
Secas,
como palavras mal proferidas
como bocas besuntadas em veneno
sulcando a derme
de incuráveis feridas
Secas
gargantas engolem
setas flamejantes de infâmias
insultos, inverdades, insensibilidades...
que queimam enquanto cortam
as entranhas do ego
Secas
lágrimas extintas
ante a conformidade
impassíveis faces esfaceladas
do brio da esperança
Secas
jazem as fontes da vontade
secas de projetos ousados,
de sonhos-miragem
E ante as algemas da responsabilidade
o espelho dos outros
nos insultam
mediocridade
Secas
são suas bocas profanas
insanas, fétidas
secas suas existências
seus legados de coisas
Secas
Suas medalhas enferrujam
enquanto a vida jorra afora
um mar de sabedoria
no qual nunca hás de banhar
Secas
as folhas passarão,
o teu frio congelará
castigará
mas assim como o inveno passa
o vento já estala a fundação da tua folha
e em pouco voarás em retorno
do pó de onde vieste
Secas
suas palavras cairão no esquecimento
porém as estações se renovarão,
virão primaveras, flores
gentilezas da vida
Exalarão perfumes
e haverá serenata de pássaros nos fios
novas margens, novos rios
Secas
suas almas como gravetos hão de crepitar
como o fazem espinhos no fogo