domingo, 29 de abril de 2012

Bzzzz


Zonzas as abelhas zoavam

Em rasantes, zumbiam

Zum zum zum


Pousavam e zarpavam

Em danças zumbis

Zunindo-lhes as asas

Entre rosas cor de rosas

Flores azuis, lilases


Meninas, as abelhas

Voavam zelozas

Os zangões sisudos

Desenhavam realezas

Tão claras as luzes


Européias, às azaleias

Ruidozas as vozes

Casadoiras faziam

Ai!

Ferrão infeliz, bem no meu nariz!

terça-feira, 24 de abril de 2012

Pulso


De um ponto a outro a diferença de um pulso.
A energia propulsora do segundo seguinte
Pinte...

um momento
Requinte

um prolongamento
Seguinte

um alongamento
Vinte

um acento
Irrite

um lamento
Grite

um alimento
Frite

um contentamento
Fite

um estranhamento
Rabisque
Chapisque
Pisque
Wisky

Silencio
Parado, calado, atordoado, alado

Comente
diz-que-me-diz
que disque
cisque

um doente
Cistite

um crente
Cristo

um ente
Visto

um casamento
Isto

um acasalamento
Risco

um engravidamento
Bebê, eu amo você

Fique
Ataque

Ligue
Desate

Ate
seus pontos...

sexta-feira, 20 de abril de 2012

Espera



Esculturalmente a mulher espera,
entre nesgas, vincos, réstias de si
A mulher espera, estatuesticamente
Badalam as areias do tempo tac tic

Entre dias de sol, tempestades, uivos
A mulher espera, uma espera sem fim
Nuances, tenores, ardores... sai dias
Despetalam-se suas cores: faz cinzas

Noites inteiras, sibilam nos doces fios
de seus cabelos entre o vento faceiro
Novas cores renascem do talo filheiro

Carrega da seiva do tempo, renovo
Introduzindo ao jardim da vida
A nova vida a esperar a hora do ovo

terça-feira, 10 de abril de 2012

Horas Mortas



            Repicam os sinos na torre da matriz. A brisa taciturna esfria o concreto que emerge do solo estéril.

            Julho é um mês frio, as insidiosas lufadas gélidas mentem o sol que prometera aquecer o frio intenso.

            São seis horas da tarde, apressados se locomovem os transeuntes. Brotam da portas semicerradas que os mantiveram em movimento frenético durante as horas do dia que se despede para sempre, porque o hoje sempre morre e o amanhã é incerto.

            Agitadas correm as secretárias em seus impecáveis uniformes cotidianos, vestem a sorte do emprego e não permitem que nenhuma réstia de ousada brisa se lhes descubram. Até mesmo Zéfiro perde seus poderes ante a garra que demonstram ao correr em desespero para o ônibus das seis e quinze, segurando a barra teimosa das saias.

            O ponto de ônibus é um encontro rotineiro de desconhecidos que partem para o vazio de suas vidas.

            A tarde sopra nos fios um uivo triste, os pássaros se recolhem e até mesmo os periquitos inquietos silenciam a algazarra.

            Algumas pessoas correm para as filas, outras se sentam sob a sibipuruna banhando-se das minúsculas folhas insistentes que caem teimosamente. Outras se sentam nas gradezinhas que protegem as raízes das árvores, pouco a pouco os carros vão ralentando.

            A penumbra gradativamente cobre as formas coloridas. Um velho acende um fósforo e o aproxima dos lábios dos quais pende um cigarro. Eis um lapso em que toda a paisagem muda; um rosto vincado iluminado pelo fogo emerge da escuridão, por um instante ao entreabrir os lábios o homem é visto por dentro, o vermelho do sangue salta da pele transparente à luz da pequena chama.

            Então ela surge, os cabelos oxigenados emoldurados por um lenço esvoaçante e colorido, empalidecem ainda mais sua figura esguia e pequenina. Ela traz os pés descalços como se a terra fosse sagrada. Hoje ela é Esmeralda, veste-se de cigana e nós Quasímodos nos deparamos boquiabertos a espera de que a qualquer momento ela rodopie ao som dos tamborins.

            Ela passa impassível, a cigana da praça não pede as mãos de ninguém, antes estende as suas a espera de uma moeda para o pão de hoje.

A cigana da praça não prevê o futuro de outrem pois ela é sábia, guarda consigo o segredo de que ela é o futuro.

Lentamente semicerrando suas pálpebras iluminadas por um holofote ocasional da iluminação da matriz, para então abri-las novamente focalizando um outro ponto onde fica seu lar: os duros bancos do jardim.

            Mas ela sorri, é a Bela do jardim, princesa de si mesma segue mancando para o destino que a sorte lhe trouxe.

            O ônibus chega, o embarque é rápido e a partida breve, contudo, antes da partida, ouve-se o som de tapas vigorosos e gritos frágeis por socorro.

            Vagarosamente o ônibus arranca. De trás da árvore a cigana chora arfando o peito franzino com todas as forças que ainda lhe restam, parece um pássaro ferido; espalhadas a sua volta jazem os fragmentos de sua vida, farrapos coloridos que já foram de outrem. Ao lado dela um hercúleo garoto lhe brada uma coisa qualquer, gesticulando agressivamente. Estendendo as mãos ela tenta freneticamente recolher seus pedaços.

            Impassíveis os rostos alienados do ônibus observam a cena se desfocando, lentamente desaparecendo. O ônibus vira a próxima esquina. Tão rapidamente muda a paisagem, os passageiros já viajam em outros pensamentos. Interiormente dizem a si mesmos que cada um segue o seu destino.

Exótica


Lânguidas, róseas, etéreas
pétalas
húmidas, cálidas
sem falsa modéstia
se abrem as partes,
em beleza, sensualidade,
leveza,
Que brutalidade pensar
na tua fragilidade
desflora-te ao simples toque
de um beija-flor
auto fecundada
do beijo faminto
gritas ao infinito
estendendo suas pétalas
te mostrando assim tão toda
nua
Insinuando as delícias,
as doces nuances
te pintas
em romance
ao sol que te beija,
amante orquídea

segunda-feira, 9 de abril de 2012

SUA

 A fada da floresta dormia. Sonhava um sonho muito redondo, azul.
No sonho da fada da floresta, do azul emergiam linhas retas, paralelamente horizontais, do alto de seu sonho admirava-se a nitidez da organização.
Caiu a noite, a escuridão não era plena pois cinquenta e uma estrelas cintilavam no azul profundo.
O sonho principiou em pesadelo.
Os canteiros das rosas vermelhas que se entrevia quando claridade total faziam-se monstros violentos, alimentadas do sangue inocente derramado desabrochavam em pétalas tenras.
O azul se fazia taça transbordando das lágrimas do mundo todo. A fada principiou a chorar sem saber a razão, imediatamente das suas lágrimas brotavam umas florzinhas azuis pequeninas, que apressadas em crescer rompiam do solo num parto doloroso.
Então a fada avistou cravos, lindos, tão brancos que lançavam um pouco de luz à obscuridade. Pasma com tamanha beleza conseguia vislumbrar-lhes a pacífica inscrição implícita.
Novamente o inesperado. Suas asinhas se tornaram douradas, perdendo a leveza ao peso da nova cor. Lançada pelo ar mergulhou na cama de cravos macios.
Que fado a uma fada! Transformada em ouro fora cair nos leito dos cravos ourívaros. Seus últimos instantes lentamente transcorrendo, sentiu as raizes que se erguiam do solo como tentáculos enquanto era absorvida pelo solo arenoso.
Foi então que a menina em um sobressalto acordou de vez. Estivera sonhando acordada fitando a bandeira.

quarta-feira, 4 de abril de 2012

Café

Entre o burburinho dos clientes, entre o ruído das máquinas moedoras paira um aroma de café. É o café de uma livraria enorme chamada Barnes & Nobles. Estou sozinha, uma au pair nos Estados Unidos. A cidade é Bethesda, suburbio de Washington DC. Parece o paraíso das revistinhas das testemunhas de Jeová. Tudo organizado, bonitinho, casas amplas, boas escolas e flores nas janelas.
Não fosse o aroma insidioso do café que me entra pelas narinas. O café aqui é servido em copos grandes, demorei a acostumar com o sabor. Dizem lá ser o melhor do mundo, mas não creio que já tenham provado o café da minha mãe; ou aquele que meu pai me fazia após a aula na faculdade.
Café e saudade se misturam quando experimento a bebida forte, levemente adocicada. Lembro dos paralelepípedos bicolores da minha Votuporanga, do café na Hammer: café com amigos. Até o cafezinho da garrafa escorrida do chinesinho, que saudade. Hum, o café caipira que minha avó torra, o da livraria universitária nos intervalos. Café com livros. Noites em claro.
Nostalgicamente vejo meu passado refletido no café fumegante. Lembro-me do cafezal do meu avô Fidelcino. Das viagens de trem para Bálsamo com minha avó Alzira, como era lindo ver os cafezais correndo pelas janelas do trem.
Café lá em casa é tema para discussão séria: "o Flor da mata?" Deus me livre - "parece milho torrado" ou "o Ribeirão sim já foi um grande café, mas ultimamente..." E assim iam, longos colóquios ao redor de uma mesa pequena, rodeada de muitas cadeiras sempre lotadas e entre xícaras da fumegante moca.
Café aqui é bom. Compro um copo "big" e sento solitária a ler, olhar a vidraça ou então tomo no carro enquanto dirijo. Café com solidão.
Mas quando sento a mesa com um café, Votuporanga se torna o recanto mais florido das minhas memórias. O combustível perfeito para eu sentir vontade de escrever. Café com pena.
"Vamos brincar de pique?" Ecoam os resquícios da minha infância "a Maélly é café-com-leite!" Até nossas brincadeiras eram ao sabor do café.
E ainda a piadinha boba do Gesiel: "qual é a diferença entre o homem e o bule? É que o homem tem fé e o bule é para por café! Ah ah ah!" - ria sozinho, a gente rindo mais dele que da piada.
Café de bule, coado no coador de pano da vó Zira, da vó Téia, das tias todas... cada casa, cada momento um sabor de lembrança.

terça-feira, 3 de abril de 2012

Contra a vidraça

É como se borbulhando o instante das sensações me preenchessem de uma certeza que desconheço mas sei.
De repente o vazio ambiente é preenchido por uma substância penetrante, ondulosa, pressurizando pele, cabelos e os olhos tornando-se translúcidos. Vê-se as coisas que são como são, mas que no instante simplesmente deixam de ser.
Acordes, vozes distantes, cheiro de café fresco preenchendo tudo. O movimento desliza como grãos de areia na ampulheta do instante.
Contaminada da doença de escrever deito os meus profundos devaneios em papéis quaisquer. Não, não são palavras importantes, não há necessidade de que as mesmas sejam lidas. Escrever é falar comigo mesmo e me sentir só em minha companhia.
Lembra a estorinha do peixinho que o homem pescou e criava como um cachorrinho, carregando-o pelos elevadores e cafés?
É a mesma coisa. Não posso mais ser devolvida ao lago, desaprendi a nadar. Vivi enclausurada em meu casulo fétido, escuro e feio. Agora borboleta anseio ar fresco e bato minhas asas contra o vidro do aquário bonito.